sexta-feira, março 17, 2006

A primeira vida de Carlos Alberto Vidal

Conhecido da generalidade do público através da personagem de Avô Cantigas - que comemorá 25 anos em 2007 - o cantor, actor e músico Carlos Alberto Vidal tem uma carreira cujo ponto de partida discográfico foi o já longínquo ano de 1973. Com efeito, a sua estreia ocorreu com o single As Filhas da Tia Anica, uma composição cuja letra de contestação social é magnificamente servida por arranjos inspirados de José Calvário, publicado pela Imavox. No ano seguinte, chegava Bom Dia, Senhor Alberto!, que seguia a linha temática da sua antecessora. Ambos os discos apresentavam no lado B baladas com aproximações a um universo rock. Seria, no entanto, em 1976 que Carlos Alberto Vidal teria oportunidade de mostrar de forma cabal os seus talentos - e que talentos! Changri-Lá é um dos trabalhos mais válidos e meritórios de toda a história do rock português, publicado ainda sob a alçada do contrato com a Imavox. Abrindo com a canção-título, onde a voz de Vidal nos mostra a raiva e a doçura em momentos distintos, merecem destaque as prestações de Necas (bateria), Nuno Pimentel (teclas) e Fernando Correia Martins (guitarras). O disco segue com Venho por Cristo Dizer - que confirma lírica e musicalmente a temática mística de todo o álbum e onde encontramos os sopros de Rui Cardoso - e, entre outras, com Emanuel - com um toque africano no final, sendo a voz novamente um elemento de grande equilíbrio musical - e O Meu Nome Somos Nós (Maharaj-Ji) - apenas e tão só uma das mais belas canções rock feitas em Portugal, com um refrão de antologia. No lado B do LP podemos ainda encontrar Luísa Vai para a Escola, toda ela delicadeza e com uns toques honky-tonk a lembrar o jardim de infância que escutamos ao longe, e Nascer, um tema ao piano da autoria de Nuno Pimentel e que constitui o brilhante final para este trabalho.


Publicado um ano antes da estreia em longa-duração dos Tantra, Changri-Lá é um pequeno pedaço da história desse gigante desconhecido que é o rock português pré-1980. Embora musicalmente se aproxime bastante das fórmulas do rock progressivo de então - sendo, aliás, dos trabalhos mais sólidos feitos em Portugal nessa área - apenas encontramos alguns ecos do mesmo nas incursões igualmente místicas do grupo de Manuel Cardoso e António José de Almeida. Ninguém mais, no Portugal de então, conseguia romper a difícil barreira das editoras discográficas e apresentar trabalhos desta envergadura. Não podemos esquecer, aliás, que durante os anos de 1977 e 1978 o grupo Perspectiva, de Tó Pinheiro da Silva, lutava pela edição de A Quinta Parte do Mundo, um trabalho de que, como disse António A. Duarte no seu seminal ensaio A Arte Eléctrica de Ser Português - 25 Anos de Rock 'n Portugal, todos nos orgulharíamos hoje em dia conquanto dele nos recordássemos... Mas, face a essa impossibilidade, oiçam Changri-Lá e deleitem-se com os mistérios e maravilhas que este disco tem para oferecer.

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Comments:
Grande som sim senhor o de "Changri-Lá". Esse desconhecido (ou quase) rock português pré -boom de 1\980, revela-nos bastantes surpresas.
 
É verdade, e tu também o sabes. Abraço
 
Segundo parece...porque não fazia a mínima ideia...
http://www.rtp.pt/wportal/sites/tv/festival_cancao06/cancoes/josemar_bem.htm
...faz também parte do curioso e animado projecto MariaFolia que concorreu ao último festival da canção...
 
Também não sabia! Mas não deixa de fazer sentido, já que o António Pinho é a outra metade criadora do conceito do Avô Cantigas. Se o projecto MariaFolia tivesse ganho o Festival talvez chegássemos a uma posição de destaque lá fora... Agora, assim, com a miséria que venceu (à conta dos três elementos não-músicos do júri, é importante que se diga)... Enfim...
 
devo confessar que já não vejo o festival da canção há imenso tempo! também esse ficou p mim perdido nos anos 80, como tantas outras coisas...
A invicta vai bem, João! Já vieste cá ver a colecção de discos da retro paradise? descobri esta loja o outro dia, depois de muito me falarem dela - acho que talvez gostasses de passera por entre os LPs e singles deles :o)
 
Bom dia, Luísa! Estive na Retro Paradise uma vez, em Janeiro. Fui de fugida ao Porto, e uma hora antes de voltar para baixo passei por acaso na loja. Muito boa, é verdade! Beijo com saudades
 
Tenho uma ideia muito parecida com a tua Bissaide...não ganharíamos com MariaFolia é certo, mas faríamos quase de certeza uma figura muito mais interssante do que aquela que vamos fazer (no dia seguinte, ouvi todas as músicas e se a vencedora não era a pior andava lá bem perto)...de resto, basta a recoradção da boa participação da Lúcia Moniz...
 
Pois, também acho que a vencedora é uma das piores... Tens razão, a participação e a boa classificação da Lúcia Moniz - 6º lugar, a melhor de sempre - poderiam servir para tirar lições. No entanto, logo no ano seguir foi o descalabro, com aquela coisa inenarrável chamada "Antes do Adeus". Por mais respeito que eu tenha pelo saudoso Thilo Krasmann, não sei o que lhe deu dessa vez para compor aquilo...
 
Aliás, quase que arriscaria a dizer que a partir daí foi cada tiro no pé ui ui!
 
É verdade, de então para cá tem sido tudo ao lado... E este ano, que tínhamos oportunidade de nos redimirmos, decidimos levar as mui talentosas Nonstop... Escolhas...
 
Pois...
Escolhas :)
 
Ora ai está um dos Lps que há mais tempo procuro, gostaria de me deliciar e aventurar pelo som deste Lp Changri-Lá, se alguém o tiver pelo menos em formato digital agradeço que o facultem.

Excelente trabalho bissaide

Cumprimentos do culto do vinil
 
Já consegui o registo, algumas das musicas são de uma qualidade harmoniosa que me deixam simplesmente com vontade de repetir e repetir o cd. Muito bom.
 
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